Deparado com torrentes de ingenuidade, questiono a sua ingenuidade.
Genuinamente, ou não, esta fatia de gente que se assume como parte do tema, parece uma vítima de uma coisa externa, uma vida infligida, uma condição imposta. É como se, inquestionavelmente, um fenómeno autónomo tomasse conta de tais vidas. Atenção, não foi de repente nem de surpresa. Foi assim como que acontecendo aos poucos e agora há que manter a razão de tal aparente noção.
A sustentabilidade da ingenuidade é tanta que qualquer humano se tenta livrar dela. Em qualquer momento da vida de um ser, a superação da ingenuidade é inevitável. No entanto, estes outros que se mantêm fiéis a este assombro moderno, aceitam romantizar esta forma de vida totalmente fora de moda, como um retorno ao ser o que só vive pela crise pessoal.
Vejo esta decisão como uma justificação de precariedade. Social, profissional e profundamente intelectual. Um mecanismo de afastamento da nossa própria existência para um modelo de um suposto inadaptado capitalista, moderno e genialmente hipócrita.
Geralmente repetem manias, higiene, gestos, trajes e costumes e discriminam em grupo. Geralmente artistas, profissionais liberais e conhecidos como “criativos”, oscilam entre o bucólico, o tal ingénuo e o depressivo, vulgares. Por estes mesmos adjetivos diluem quem realmente não se consegue libertar destes estados e banalizam a necessidade de ajudar quem realmente assim é e assim vive.
Esses que precisam de ajuda não são os ingénuos, são efetivamente a reprodução kafkiana de uma vida atribulada. São os lesados de um roubo social, perpretado por mentes doentes e intencionais, que se deixam a uma ingenuidade de pose e comparação baixo entre os mesmos sinais entre iguais.
O verdadeiro ingénuo não persiste, existe durante o seu estado e assiste à sua transição. Transtornar o mundo com a intenção de uma vida assim é um crime demasiado corrente e atual.
Narcisismo, encoberto pela raiva de uma existência precária, demasiado real.