Saudade, melancolia, marasmo, taciturno, bucólico, romântico, são termos apropriados pela maioria para descrever o outono. Talvez seja pela luz, chuva, temperatura ou primeiras tormentas… Decididamente é pelo tempo que agora somos “obrigados” a passar em casa, dentro dos horários urbanos, abrigados e em preparação do pior que está para vir, o inverno. Racionalmente, percebo a questão, principalmente porque o precedente é o oposto, onde geralmente se usam termos como liberdade, atividade, exuberante, estival, alegria, frescura. Acho interessante a perspetiva negativa, depressiva e opressora do estilo de vida ideal que certos humanos têm desta altura do ano.

Essa transição comparativa é em si o grande catalista emocional da época : uma influência do meio, uma circunstância ritual onde identificamos que estamos a passar de um estado para o outro e onde o nosso conforto físico e mental vem instintivamente ao de cima. Também podemos observar o impacto ( bem menor ) que esta transição tem em ambiente urbano, onde até o clima parece regulado. O conforto desta vida ( urbana ) nem sempre é dependente da meteorologia : uma chuvita aqui e ali, um vento mais forte e tal mas, o passeio, a rua e o modo de habitar continua disponível e a funcionar, por isso, nada afeta ou muda.

Ora, fora do contexto urbano, o cenário é diferente. Em aglomerados médios a definição de urbano permanece, mas daqui para menos tudo muda.

A primeira diferença começa no verão, onde o desprestígio da sobrevivência animal ( humano/não ) não dura o tempo das férias normais.

Segundo, a reclusão acontece em grupo, de uma forma comunitária e preventiva.

Terceiro, esta hibernação forçada garante o tempo de purga que o humano urbano não se sabe proporcionar, e que tanta falta lhe faz. Este tempo para si, ti ou para o eu, é um tempo que garante a força necessária para receber a estação que está por vir e aí sim, garantir a preservação basilar da existência individual nesta certa realidade. Em ambiente urbano persiste o desprestígio desta realidade, principalmente pela garantia proporcionada pelo ambiente circundante, onde tudo é dado como adquirido e se na sua falta, basta passar a tema de revindicação para tudo se normalizar.

Já não sabemos sobreviver e isso é que é o nosso habitat natural. Obviamente que não comparo com o tempo de fugir das bestas para não sermos comidos, mas consigo afirmar que quem “come da terra” está a desaparecer. Falo então do ciclo, da doutrina, da rotina e da comunhão natural com o meio, do domínio do habitat pretendido, não pela subjugação do material e da técnica que só o humano impõe pelo engenho, mas pela ecologia do tempo, do ambiente e da necessidade proporcional ao esforço disponível. Tudo agora é demais, é exagerado, é feito para infligir dano, dolo e destruição.

A equação é esta : o contexto sazonal, a condição existencial, o ato convivial e a subjugação do meio, condição do habitat, pela razão da sobrevivência.

O resultado é um factor mínimo para muitos, com taxa de crescimento exponencial para todos e que certamente alguns vão musealizar neste texto num outono do próximo tempo. Vamos todos ser agricultores, trocar cereais entre nós e artesanato às noites, calmas pela ausência da informação digital! Claro que não, os tempos mudaram, e a nossa adaptação foi por adoração. Deixamo-nos ir nessa crença do progresso a qualquer custo. Passamos a notar menos porque tudo tem menos impacto neste ambiente urbano e social.

Basta sair da esfera da cidade para se perceber como isto é óbvio, claro e fundamental. Essa saída não precisa ser física, basta uma cidade capaz de pensar assim enquanto acompanha o raciocínio proporcionado pela dita equação.

Neste tom, significativamente nostálgico, posso cair na razão do que estou a argumentar diferente, mas se pensarem que as minhas férias se passam assim, talvez concordem com o que desperto e incito a rever. Deixem lá o verão passar porque o tempo de viver não escolhe estação, nem lugar, escolhe somente a ética do ser, na humanidade do querer, algo melhor para mim, que só assim pode ser para todos.