Ideia

Storyline

Sinopse

Guião

1. Quem e porquê.

2. Quando e como.

3. Onde e enquanto.

4. Quantos e de que forma.

5. Para quê e com que razão.

6. Resultado.

História

Capítulo 01

Capítulo 02

Capítulo 03

Capítulo 04

Capítulo 05

Capítulo 06

Conclusão

Posfácio

Coleção Livros Sólidos

Ideia

Uma história clássica, um conto de base infantil, polarizada entre a alegoria e a fábula, substituindo o tema animal pela constante tecnológica nas nossas vidas.

Um tema intemporal amplificado pela proposição de uma nova ideia sobre a evolução da relação entre o ambiente humano e a tecnologia que aceitamos projetar na nossa presença social.

Storyline

O génio seguiu, com vontade de ir.

Subiu, subiu e começou a sorrir.

O que via era diferente do que a menina trazia,

pois é real o que agora sentia.

Assim viu o que tinha aprendido,

mais do que pensava ser possível ganhar.

Esta é afinal a história,

da menina que levou o adulto a voar.

Sinopse

Uma menina robô, que voa, e grava o que vê.

Mas será que o sente?

Grava tudo para o seu génio, que assim vê o mesmo, até o que quer que a menina seja.

Um erro, uma anomalia, um contato e a curiosidade que altera a perceção do que somos para nós, para os nossos e também nos outros.

A esperança na mudança, na perspectiva da evolução pessoal e também na normalização da noção de semelhantes demanda pela identificação de grupo.

A libertação de facto ou somente uma falácia do cativeiro em que vivemos?

No final, prevalece a suposição da real liberdade e dos mecanismos que construímos para sermos então assim, simplesmente humanos.

Guião

1. Quem e porquê.

A primeira descrição e apresentação da menina robô.

A introdução é intercalada com a descrição do génio, numa apresentação muito controlada e diluída nos momentos dedicados à personagem ao longo da história; esta descrição é assente na colocação da personagem perante o ser biológico ( e portanto, previsivelmente de outra espécie ) que não voa nem vê além do seu espaço-tempo presente, ao invés da tal menina robô.

A falta de perceção da menina robô sustenta a possibilidade do tema ser : ou sobre uma criança ou sobre uma máquina. Há dúvidas, mas também há pistas. A primeira dúvida é deixada no final da introdução, imediatamente antes da passagem para o próximo capítulo e por isso, o verdadeiro início da história é aqui. Nesta pista, é marcada a dúvida sobre o que a nossa própria percepção consegue realmente atingir.

A máquina ( menina robô ) é representada na solução do génio como uma espécie de ferramenta que a sociedade quis assumir e que prevalece como plausível, necessária, para o tipo de trabalhos que são descritos na história.

2. Quando e como.

Noção das rotinas diárias, semanais, monocórdicas como as batidas de um compromisso, representadas nos tempos de saída e de recolha a casa; sempre à mesma hora, sempre com a mesma duração, sempre com o mesmo resultado. Esta é a ligação com o reflexo da monotonia do meio familiar, prevalente mas que rejeitamos existir, uma alegoria de tantas imagens diferentes, mas que afinal são a mesma imagem de sempre.

O registo de dados constante é visto como a representação do medo de ficar alheado, da exigência do tempo e da obrigação de manter o acesso a tudo e a todos, confundindo a curiosidade com o mero conhecimento das coisas mais simples. Como consequência ( da falta de experimentação destas “coisas”, as que achamos sempre diferentes e que são sempre iguais ) vivemos dormentes nessa atividade repetitiva e saturante do mero registo e à qual nem nos apercebemos chamar de vida. É evidente a aproximação moral ao ritmo a que se vive, onde se exige a reflexão sobre porque nunca paramos para pensar e porque continuamos sempre a alimentar a sensação de incompletos e insatisfeitos. Este é o conceito que introduz mais um pouco do génio, ao garantir a presença social do ato, num conjunto de valores pessoais que nunca serão virtudes senão a exponenciação da insegurança, do desconforto e a representação exata dos nossos defeitos projetados na nossa menina robô.

A história segue com a descrição da forma como a menina robô voa, sempre ao alcance da antena do génio. A caracterização desta condição de liberdade, na comparação do plano de voo com a descrição do raio de recolha de dados, apresenta um limite de algo ainda por decifrar. Este limite, que pode ser comparado com o raio de alcance ( tecnológico ) é utilizado para descrever como o génio depende dos seus próprios ciclos de querer, fazer e ter como o seu modo de controlo – ao ser nada mais de facto que um humano com o acesso a tecnologia e também ela, normal. É assim que a segunda dúvida é apresentada ao leitor, sugerindo que o acesso à tecnologia faz de nós génios só porque a conseguimos usar, ou então se não somos assim as vítimas da nossa própria decisão de a aceitar.

Esta é a primeira crítica direta ao projeto educativo familiar, na decisão que faz de nós próprios os robôs da suposta solução de educação, pela normalização das decisões dentro da “genialidade” da tecnologia atual.

3. Onde e enquanto.

Pelo céu do seu mundo, a todas as horas do dia, para captar essa vida que eram os outros que a viviam. A menina vê tanto, regista tudo, vê tudo de todos e no entanto nada é seu. Vive assim por alguém e não por si mesma.

O limite do raio de alcance que o génio não quer ver ultrapassado é representado pelo uso do sinal de aviso ( supremo e muito sério ), o único que a menina robô conhece sempre que se tenta afastar mais do que deve. Este aviso, sob a forma da terceira dúvida partilhada entre as decisões a tomar pelas duas personagens :

  • evolui a personagem do génio, que passa assim da insatisfação para a insegurança projetada numa dolorosa forma de chamar de volta a menina para o espaço de conforto da casa de ambos
  • define a personagem da menina, na forma típica como se sente impelida pela curiosidade natural de uma criança a seguir o seu instinto de descoberta, pela experiência, conhecimento e exploração, quase desobediência

É proposta uma visão sobre o final do dia e sobre as rotinas de contato com o exterior ( inicialmente descritas como a vocação da menina e o grande objetivo da sua existência ). Este capítulo dá continuidade à representação das rotinas pessoais, refletindo sobre os tais momentos de uma forma mais detalhada e específica. Com o objetivo único de aprofundar a visão sobre a dinâmica das personagens, esta ampliação por detalhe, reflete essa intimidade doméstica :

  • a menina robô chega e pára, aterra em frente ao génio à espera de uma autorização, submetendo a sua tarefa ao escrutínio do adulto, que também ele chegou ao final do seu dia
  • o ato de entrar para o seu espaço, o local reservado ao seu corpo
  • descarregar os dados do registo diário, ligar-se à infraestrutura de casa, guardar tudo o que acumulou na sua descoberta durante o voo
  • carregar a bateria : o simbolismo do descanso reparador, representação da ausência dos ritmos familiares, na forma como a menina se desliga do mundo mas permanece ativa ao carregar-se para o dia seguinte, sozinha, no interior do seu espaço, o armário
  • a representação do compartimento ( quarto ) onde não falta nada para a sobrevivência mas onde não existem as histórias, a interação social e o tempo familiar, hoje vulgarizados sob o pretexto da independência e da autonomia como a nova realidade dos mais novos, os deste presente

Determinante para a conclusão da visão intimista e amplificada da vida doméstica, para a continuidade da história e para a introdução de uma nova personagem, é proposta uma saída de plano para a visão geral desse mesmo dia – um dia de tanto ver, onde nada fazia supor que a sensação de contacto com uma nuvem sugere um desenlace diferente.

4. Quantos e de que forma.

Para que a introdução de uma nova personagem tenha a devida importância, provocando a sensação de descoberta e catarse, a história evolui num tom inesperado. Intencionalmente, a narração reinicia com novos cenários e é dada como adquirida a saída panorâmica que fecha o capítulo anterior. Assim, parece que tudo é novo com a assunção da nova personagem ( a do menino ) e a jeito de epitome, o início do capítulo impõe um novo ritmo entre as personagens.

Assistimos :

  • à descoberta do mistério do código viral, com a inclusão do menino ( que não é um robô ) e a aproximação ideológica da menina aos meninos do solo
  • à reflexão sobre a mensagem de aviso que entra no código da menina e despoleta a vontade de voar para um nadinha fora do raio inicial – tudo como o menino queria – para despoletar o aviso do génio
  • à reação do génio à anomalia nos dados de controlo e a sua tentativa de resolver um problema que não é problema
  • à intensidade do tom do narrador que está a descrever a esperança do possível
    • na mudança da personagem do génio pela presença do menino
    • na verdadeira experiência e aprendizagem da menina, que está a deixar de ser robô
    • no menino em si que não é mais do que um menino normal

É dado a perceber que o número é muito maior do que podia ser imaginado. Todos feitos de peças iguais, numa roupagem de normalização e tudo isto por quem menos se espera, os pais. Esses meninos, ainda robô, que partilhavam a mesma “vida real” sem nunca se cruzarem.

Este cruzamento de dúvidas constantes, propostas pelo narrador de capítulo em capítulo, dão o tom formativo e educativo ao público alvo. O ritmo é determinante na forma como classifica a ausência de um público concreto, ao mesmo tempo que garante a transversalidade da história para a condição da fábula geracional, clássica e intemporal.

Seja pela idade física, tanto quanto pela consciência ou até pela maturidade intelectual, os pontos notáveis das diferentes etapas da vida humana, estão presentes e são convocados. O narrador mantém a supervisão amoral dos papéis e das ações desempenhadas no processo de consciência e evolução de infante para adulto.

5. Para quê e com que razão.

O encontro com o menino real, o que enviou a mensagem com o código do suposto erro, despoletou na história as noções de curiosidade, saudade e amizade. Foi assim que a menina percebeu que precisava estar com outros meninos para sentir a diferença entre o registo e a experiência. Só assim podia perceber definitivamente que o que pensava sobre o facto dos robôs existirem em todo o lado e em todas as gerações, afinal não passavam de estados de espírito. Descobriu até, que há meninos que voam e não são robôs.

Este capítulo dirige o ritmo da história na sua precipitação para o final, tanto quanto demonstra o interesse da menina em deixar de ser robô. A metamorfose da personagem assenta na forma como este ser consciente sai da carapaça, armadura reconhecida por alguns, e que agora é visivelmente transparente e integrada no seu corpo – esta armadura é utilizada como metáfora da proteção exagerada, o que apesar de necessário, precisa ser equilibrado com a exigência dos mecanismos de defesa da vida em sociedade. A assunção da necessidade implica o equilíbrio da sua aplicação, responsabilizando o génio pelo peso, espessura e até pela área de cobertura que escondia a verdadeira menina biológica no seu interior. Esta noção da menina ser também biológica nunca é explícita, serve antes para facilitar o entendimento da história pelo público infantil ao retirar o efeito da máscara.

Ainda não é o vôo do génio, mas a descoberta do fato que nunca usou, sem tecnologia, antigo ( do seu tempo ) antevê a possibilidade do último capítulo.

Para finalizar este momento, o narrador sugere a transição do foco do herói menino para a futura menina, que agora já é vista como potencialmente, não robô. A dúvida final é dissipada pelo efeito que tem a certeza de que ela é a heroína da história, pois irá salvar a personagem ( agora ) claramente assumida como pai. O menino não é herói, é só menino pois não salvou a menina, só partilhou o que sabia. A menina é assim a verdadeira catarse pois passou a ver o que não via, e que descomprometidamente não lhe era permitido ver.

6. Resultado.

Mais do que a conclusão da história, este capítulo pretende libertar as dúvidas presentes em todos os capítulos anteriores com uma resposta simples e objetiva. No entanto, é apresentada uma solução sob a forma de uma abordagem, quase uma hipótese e não sob a forma de uma resposta estanque e asséptica da vida real.

São impostas algumas realidades polarizadas dentro da própria história que reviram o entendimento moral e a evolução natural das personagens enquanto é perpetrada uma conclusão no tom mais clássico possível ( a reviravolta final do que pensamos ser verdade é assim uma outra forma de ver as coisas ) :

  • a menina que passa a heroína real, um ser humano com as caraterísticas próprias de um infante, relatado desde a inocência até à eterna curiosidade em aprender e ser maior
  • o génio, que pensava ser genial mas era o que sempre foi, um humano normal até vestir o seu antigo fato e voar
  • o menino, o catalisador da mudança e a representação dos pontos de vista, nas inúmeras possibilidades de crescimento e formação individual
  • o narrador, a crítica virtuosa da moralidade e dos valores atuais, o palatino da esperança e do espaço intemporal da história

O vôo. O verdadeiro final, em conjunto. A menina, o pai e o menino, sobre todos os outros meninos que deixaram de ver de tão alto e que passaram a reconhecer mais perto. A escrita no céu, como a mensagem que não precisa ser codificada para que mais meninos ( e os seus génios ) possam ler. Deixar acordar a menina robô, na tal catarse de iluminar e acordar o génio, descreve como a inocência do robô, agora menina, contagia a vontade em melhorar e permite aumentar o target da história também para os adultos. Este altruísmo, inocente e típico de um infante, age como a crença inabalável da criança no adulto que a protege, e por isso, não o deixa para trás e por isso, exige a sua companhia a voar.

História

Capítulo 01

Era uma vez,

uma menina robô.


Feita por génio e tinta amarela,

curiosa de tudo,

qual gato,

nunca deixava de sair à janela.


Tinha dentro peça e peça,

parafuso, fio e circuito,

tudo muito bem oleado

muito certo e sem atrito.


No corpo de metal

uma janela de ecrã,

por onde o génio olhava

desde cedo, desde a manhã.


Foguetes nos pés,

molas nos braços.

No peito, o espelho do mundo,

na cabeça, dois lindos laços.


Antena no nariz

lentes de alcance.

Dentes de ferro

mexia-se num instante.


Passava assim o dia

a gravar para casa,

o que o génio não via

bem alto e sem asa.


Ele não voava,

mas ela podia.

Pouco sonhava,

e tão bem lhe queria.


Coração de disco,

grava tudo o que vê.

Muito e mesmo assim,

nem sabia bem porquê.


Enviava o que via

para o génio no chão,

que tudo estudava

com muita atenção.


Génio que era

não percebeu muito bem,

que a solução que tinha,

era, o problema de alguém.


Era assim a menina robô,

não mais do que a obra de um,

talvez pormenor.

Sem encanto nenhum.


Mas, teria assim

uma vida normal,

um suposto bem estar,

ou afinal…

não.

Capítulo 02

O dia inteiro,

batia o céu

e guardava bem dentro,

as imagens sem véu.


Sempre ligada,

no que o mundo lhe dava,

nunca questionada,

por quem a observava.


Podia ser mais

do que pensava saber.

Mas era quase nada,

menos do que um ser.


Uma ferramenta de olhar,

pelo olhos de quem,

não sabia mas queria,

estar no seu lugar.


E quem haveria de olhar

para cima, a procurar,

de forma curiosa e a pensar,

porque a menina, não parava de voar?


Tinha sentido e rumo real,

todos os dias a voar,

sem nunca passar,

para fora do grande quintal.


Às vezes aos saltos,

às vezes com calma,

por vezes baixinho

às vezes sem alma.


Nunca parava

nem sequer a sonhar

no que seria,

alguém consigo a voar.


Pois era a voar,

que achava que via

tudo o que era real,

afinal, o que seria?


E quando chegava por fim,

ao horizonte do dia,

sentia o limite do génio,

o aviso da tecnologia.


Tanto tempo mudo

só a descarregar,

tudo tudo tudo,

o que andava a gravar.


E na noite escura,

mesmo seguindo a ver bem,

a menina pára e cura,

fica segura, na casa que a tem.

Capítulo 03

Pelo céu do mundo,

a todas as horas,

para captar bem fundo,

sempre sem demoras.


Tinha um raio de alcance,

no limite do génio que a fez,

aquilo que num relance,

alimenta a dúvida de vez.


Soava o aviso supremo,

se ultrapassado!

Um aviso sério, forte,

o único com tom chateado.


Quando o ouviu, logo voou

forte e depressa,

tão alto!

Até a nuvem furou.


Voltou em espiral

à casa de onde partiu,

aterrou como é normal

mas o génio nem sorriu.


Foi dado o comando

que adivinha o fim,

desde o dia bem cedo

até à Lua dizer que sim.


À sua espera, de novo,

o seu devido lugar.

Aprumado, simples e limpo,

sem estorvar.


Entrava e ligava

o disco bem cheio,

descarregava pela tomada

as imagens do mundo alheio.


Sozinha a carregar

as baterias-foguete

dava sempre tréguas,

ao ritmo do seu frete.


Era este o seu espaço,

cheio de tudo que tinha.

Revestido a madeira e aço,

e com alma pequenininha.


Mais um dia pleno,

cheio das histórias que gravou

vividas por outros é certo,

nas terras por onde passou.


Terras lindas, imensas

com luzes e tinidos sem fim.

Casas e veredas,

até nuvens que mudam,

e não só a mim.

Capítulo 04

– Pensava ser única,

mas nada antevia afinal,

que outros meninos,

tinham o dia quase igual.


Copiavam-se entre si,

de maneira normal,

pensavam-se especiais

no fundo, apenas banais.


Cópias e cópias

haviam de haver,

por esse mundo fora

pois génio é raro ser.


Peças iguais,

feitas para tanta gente,

que de especial

tinham pouco, ou nada, ou diferente.


Até o génio de nada

copiava a vontade,

de ser uma diferença,

ser alguém de verdade!


Por isso vasculhava no código,

tudo o que descobria

imagem do que ser e ter,

inseguro, tudo queria.


Até que um dia a menina sentiu

o seu código trabalhar diferente.

Achou ser o génio e o que viu,

não era o de sempre.


Olhou de novo e achou :

Deve ser algo que vi noutra gente.

Vasculhou, vasculhou e por fim encontrou!

Um vírus! talvez estivesse doente.

O que seria então tamanho mal estar?

Uma anomalia, um erro?

Nunca pensou, suporia,

talvez uma nova forma de olhar.


E não é que a surpresa surgiu,

quando virou de repente,

num sítio que pensou que viu

e descobriu que era gente.


Aquela nuvem danada,

que depressa se viu furada,

afinal tinha uma surpresa,

essa, muito bem guardada.


O génio espantado,

a menina com o que viu,

pois à janela amarela,

estava um menino e sorriu.

Capítulo 05

– Fui eu que deixei

a mensagem a flutuar,

naquela nuvem fofa

por onde passaste a voar.


Quero que saibas que não é só para ti

a mensagem que levas contigo :

é para quem te cuida e protege

e para fazeres um novo amigo.


Se quem te cuida já esqueceu

como é bom o mundo em que vive,

onde há meninos como tu e eu

que também sentem de forma livre.


É um mundo bom

e cheio de amizade,

onde vivemos sempre juntos

na certeza que há saudade.


Tens contigo o meu presente

para sair dessa carapaça.

Vem! anda, sai e fica gente,

usa esse botão que te desembaraça.


A menina percebeu o sabor

do que faltava saber.

Percebeu que tudo o que via,

que podia enfim aprender.


A maior lição de todas,

conseguiu assim dar,

pois quando chegou a casa

disse ao génio o que procurar.


No código vinha a certeza

do génio ter sido assim,

um menino como a menina,

a que me descobriu a mim.


Sem parar, pela casa procurou.

Baú, roupeiro e armário

um fato antigo é certo,

mas perfeito para o seu usuário.


Tinha antenas dobradas e duras

muitas marcas e riscos sem dedo.

Era esta a primeira armadura,

a que fazia sombra ao medo.


Seriam estes os heróis

da história que nos trouxe aqui,

mas nem o génio nem o menino,

são a menina que te fala de si.


Assim viu o que tinha aprendido,

mais do que pensava ser possível ganhar.

Esta é afinal a história,

da menina que levou o adulto a voar.

Capítulo 06

E o génio por fim,

passou a infante sem medo.

Tal como a menina se revelou forte,

ao longo de todo este enredo.


Muito forte e a sorrir,

dona do seu voar,

grata ao menino por abrir

a janela que nos permite sonhar.


Feliz, voou ainda mais,

mais atenta ao novo mundo,

com tantas cores de fundo,

pintada por meninos iguais.


O génio ficou feliz

lembrou-se de si

e agora maior,

ainda se ri.


Memórias de gato

sempre a saltar,

tudo o que viu,

também um dia soube gravar.


Pensava ser genial,

como pensamos todos ser.

Não basta ser normal,

é preciso mais para viver.


E não é que saltou o tino,

desses muros que criamos

como o código do menino,

que nos disse que sonhamos.


Esse menino azul,

que viu na menina amarela

a vontade que faz,

este mundo ser dela.


E eu que aqui andei

sempre a dizer o que vejo,

nunca evitei na história

ser doce como um beijo.


Mas nem sempre

posso ser assim,

pois sou o que vejo,

e como me vejo a mim.


Juntos demos o passo,

fomos alto até ao sol.

Sem perder a noção do que faço,

sem nunca perder o farol.


E escrevemos bem alto no céu,

para que todos possam ver,

esse ponto que também é meu,

pelo qual vale a pena viver :

– abrir a janela e sorrir,

aprender a ver e gostar

não ter medo de partir

para lá de outro lugar.

Conclusão

Há nestes horizontes uma forma de ser diferente, o que mesmo a voar não se vê :

  • a menina robô que voa
  • o génio humano que a controla
  • a insatisfação transformada em insegurança
  • a eterna contaminação e a libertação pela consciência
  • a partilha do conhecimento e evolução em conjunto
  • a noção da alteração de estados pessoais em ambientes sociais
  • o meio íntimo e privado da noção individual em contraste com a interação pública e distante de outros indivíduos que nem reconhecemos como possivelmente iguais a nós
  • a catarse pessoal, desde a inocência infantil à suposta maturidade do adulto
  • a mudança ou a proposta de mudança a partir da palavra eu e não da palavra problema/solução

A reflexão crítica sobre a interação antropológica e ciente entre pais e filhos, assente na sua relação descendente direta e influente. A projeção da insatisfação e da insegurança dos adultos nas crianças e nas suas mentes inocentes que só pensam em agradar. A exploração da inocência, da inexperiência e da falta de preparação de uma criança na sociedade contemporânea, na noção da exigência dos parâmetros normalizadores entre indivíduos semelhantes.

Uma abordagem que explora os aspectos positivos e negativos, implícitos no uso da tecnologia enquanto factor educacional e no compromisso definitivo da necessidade da sua supervisão e avaliação parental. A assunção da fraqueza do adulto, como a consequência última da maturidade, na perda da capacidade de voar como metáfora da falta de consciência e da consolidação do processo de autoconhecimento.

Uma forma de expor as projeções dos adultos nos descendentes, além dos limites pessoais, íntimos e familiares, na forma como os adultos, por norma, deixam as crianças a sós num mundo robótico e absorvente, dominado pelo suposto conforto do domínio da sociedade sobre a tecnologia. As condições do processo educativo e formativo na perspectiva crítica da ausência de conhecimento sobre os reais preparos, necessários para os futuros adultos, assente na imposição de limites ( entre outros condicionantes ) que prejudicam e desfavorecem o desenvolvimento orgânico do ser infantil num adulto autónomo e independente.

A descrição do erro tático na educação de uma criança, a exclusão da noção humilde do EU.

A presença de outros e da sua influência na leitura do mundo que nos rodeia. O que gravamos é o que projetamos tanto quanto o que olhamos nem sempre é o que realmente vemos e por isso o processo seletivo, proveniente do autoconhecimento, trabalhado desde cedo para a construção natural do ser adulto.

Pela promoção da esperança, pela noção do investimento e esforço pessoal, da superação e da partilha de experiências indistintas da comunidade, mas assentes nos indivíduos enquanto promotores de inovação, evolução e cultura.

Moralismos ausentes, valores presentes, virtudes apeladas, num processo crescente de descoberta e consciência, autorizando assim o leitor apropriar-se do grupo alvo que pretende amplificar – voando, como a representação e metáfora da liberdade, do livre arbítrio mas também da responsabilidade, da autopreservação e através do ato natural da sobrevivência.

Posfácio

A menina, descrita como um robô, como uma espécie diferente, talvez de menina, talvez só uma máquina. O pai, descrito como génio e no entanto, o Ser que condiciona a forma como a menina não reconhece a que espécie pertence. A história de uma menina robô que voa para todo o lado e grava tudo o que a rodeia. Tudo o que vê e ouve envia para o seu génio criador, que vê tudo menos a forma de ver da própria menina. Objeto ou menina, uma obra de um génio como tantos outros, que se limita a transmitir desde si a visão do mundo gravado pelas suas lentes perfeitamente ajustadas. A representação da busca pelo controlo, pelo limite e pelo caminho fácil na educação de uma criança. Os “mecanismos” que um adulto prefere criar para educar e formar um ser versus o real investimento em propor uma visão única e individual a um novo e futuro Ser.

Mas um dia, num acaso ( será que foi acaso? ), descobriu muito para além do que via do céu. A personagem de um menino como símbolo de algo mais, da fiel esperança nos outros exemplos, na possibilidade da menina não ser afinal um robô. A representação da busca oposta à do pai, pela normalização e libertação de outros, os oprimidos ou até ignorantes.

Uma história que explica porque se deve aceitar a tecnologia dentro das nossas vidas, ao mesmo tempo que devemos manter o contacto social com os humanos reais, num equilíbrio que nem só as crianças precisam aprender a gerir.

A reabilitação da capacidade de voar em adulto, representado na catarse coletiva das personagens em voo coletivo. O ato consciente, representado na virtude clássica que nos classifica de novo como seres humanos na purga que hoje parece culpar a sociedade pela inocência dos mais novos.

Uma abordagem metodológica entre o uso das primeiras virtudes clássicas ( coragem, moderação, prudência, justiça ) para a consolidação dos valores modernos ( sociais, económicos, culturais e antropológicos descendentes ). Esta posição, defendida pelas pistas narrativas propostas pela personagem ausente, introduz a crítica séria e angustiada do autor perante a sua própria participação na educação de uma criança próxima de si.

Há por fim um propósito afirmativo ao grupo alvo : larga o que tens na mão e vai brincar, senão ficas como a menina robô e cresces como o génio que a obrigou a voar.

Coleção Livros Sólidos

Uma nova forma de aceder à história.

Um cubo, impresso, tridimensional, colecionável, gravado com o código que permite o acesso.