Minha querida xxxx, o copo de que falas, cheio desde o momento em que te vi, carrego-o à igual tempo. Sinto-o pesar nas minhas mãos desde cedo, quando percebi que não tinha para ti o que precisas receber. De mim não tens mais do que complicações e problemas, quezílias e vicissitudes de uma pseudo vida conjugal que nunca passou de uma experiência de laboratório e em que o rato não foste tu, te garanto. Compreender como aguentaste tanto tempo ao meu lado é para mim um exercício dual, onde por um lado penso que gostas verdadeiramente de mim e por outro te resignaste a ter-me disponível e presente para os teus mais variados afazeres sociais e familiares. A cura. Ambos os casos são também algo degradantes na minha mente, pois se no primeiro ficaste aquém da demonstração para além de qualquer dúvida (minha) sobre o teu sentimento, entrega e dedicação, no segundo a fealdade do conceito não me permite sequer vociferar o desgosto que sinto pela perda enlutada que estou a passar.
De qualquer das formas quero-te lembrar que de mim levas um pedaço. Um pedaço que sai da minha posse e não voltará, obviamente, a ser de ninguém. Sinto nada. Anestesiei-me bem quando previ perder o naco que consomes. A tua atitude taxidérmica vai somente cristalizar no tempo uma ilusão e nunca o verdadeiro nós, aliás termo e conceito que desconfio ter existido de facto.
Para terminar, e porque prometi não incomodar-te mais com a minha existência, lembro-te que por ti carreguei e sempre me dispus a carregar todos os copos do mundo. Cheios, vazios, leves, pesados. Não interessa. O que interessa é que nunca serei o cobarde, supra descrito, e que me sentes por desacreditar-nos, só porque sei que ao fim do dia o copo vai pesar. Mais, qualquer um sabe que não precisa carregar todos os copos, cheios ou vazios, sempre. Pode sim coleccionar numa belíssima cristaleira uma história leve e vaporosa feita do bom sabor do vento.
the MONSTRUKTOR